DIÁRIO DO FESTIVAL
MUSCARIUM #2 Festival de Artes Performativas em Agualva, Cacém, Sintra 13 a 30 OUTUBRO 2016 |
dia #4 | 30.10.2016 | Chegou ao fim o MUSCARIUM#2... até para o ano!
dia #3 | 29.10.2016
A conversa iniciou-se com a apresentação dos elementos que constituem Os Valdevinos – Teatro de Marionetas presentes na sala: o encenador, autor do texto e um dos dois manipuladores, Fernando Cunha; o outro manipulador, Joaquim Guerreiro; e o videasta Ricardo Reis.
De acordo com Fernando Cunha este espetáculo insere-se numa parceria que tem ligado a companhia ao SMAS Sintra desde há alguns anos, e que, à semelhança de outros espetáculos realizados no âmbito dessa parceria, tem como temática a poupança da água, e que tem como destinatários os alunos de escolas, ou os utilizadores de bibliotecas etc. A origem deste espetáculo está relacionada com uma notícia de jornal. Segundo Fernando Cunha, essa notícia relatava a história de um menino que pediu à sua mãe para comprar uma torneira para enviar por correio para África para ajudar a suprir a falta de água sentida nesse continente. A partir desse mote, Fernando Cunha foi escrevendo a narrativa durante um ano e, após esse período, iniciaram-se os ensaios, já com Joaquim Guerreiro, que também colaborou na conceção das marionetas (tendo o respetivo acabamento final sido realizado pela Ana Pinto, outra colaboradora dos Valdevinos). O encenador realçou o facto de terem como prática a necessidade de solicitarem a outras pessoas para assistirem ao decurso dos ensaios para que se tenha uma outra perceção do trabalho que estão a realizar e, desta forma, poderem limar arestas que não seriam possíveis de retificar sem essa preciosa ajuda de um outro olhar.
Ricardo Reis mencionou o facto de se ter realizado uma adaptação desta história e com estas marionetas sob a forma de um pequeno filme (que pode ser visualizado online), e que já foi exibido em alguns festivais de cinema, um dos quais na Índia onde o público e respetivo júri eram crianças.
Na sequência das diversas apresentações públicas que já realizaram, depararam-se com o facto de existir um retorno de vários espetadores que, após terem assistido ao espetáculo, afirmaram que iriam ter em atenção algumas alterações comportamentais no seu quotidiano. Apesar desse carácter didático / pedagógico há a realçar a sobreposição de uma camada poética sobre a “prosa” desta narrativa que nos foi apresentada. Com esta estratégia dramatúrgica, facilmente “voamos” da plateia e somos transportados para o palco, mergulhando assim no rico universo construído pelos Valdevinos. Um universo de esperança que existe no olhar de quem tem pouco.
Foi ainda referida pelos espetadores presentes nas duas sessões do espetáculo no Auditório António Silva, no Cacém, a simbiose que se dá entre o marionetista e a sua marioneta, especialmente no caso da manipulação direta de APARA, em que, segundo os marionetistas, a marioneta é, de certa forma, uma extensão de quem manipula, e todos os movimentos são como uma coreografia, “uma dança a dois”. Geralmente, é o marionetista a conduzir essa dança. Contudo, noutras ocasiões, é a própria marioneta a dirigir o marionetista, neste constante diálogo bailado.
De acordo com Fernando Cunha este espetáculo insere-se numa parceria que tem ligado a companhia ao SMAS Sintra desde há alguns anos, e que, à semelhança de outros espetáculos realizados no âmbito dessa parceria, tem como temática a poupança da água, e que tem como destinatários os alunos de escolas, ou os utilizadores de bibliotecas etc. A origem deste espetáculo está relacionada com uma notícia de jornal. Segundo Fernando Cunha, essa notícia relatava a história de um menino que pediu à sua mãe para comprar uma torneira para enviar por correio para África para ajudar a suprir a falta de água sentida nesse continente. A partir desse mote, Fernando Cunha foi escrevendo a narrativa durante um ano e, após esse período, iniciaram-se os ensaios, já com Joaquim Guerreiro, que também colaborou na conceção das marionetas (tendo o respetivo acabamento final sido realizado pela Ana Pinto, outra colaboradora dos Valdevinos). O encenador realçou o facto de terem como prática a necessidade de solicitarem a outras pessoas para assistirem ao decurso dos ensaios para que se tenha uma outra perceção do trabalho que estão a realizar e, desta forma, poderem limar arestas que não seriam possíveis de retificar sem essa preciosa ajuda de um outro olhar.
Ricardo Reis mencionou o facto de se ter realizado uma adaptação desta história e com estas marionetas sob a forma de um pequeno filme (que pode ser visualizado online), e que já foi exibido em alguns festivais de cinema, um dos quais na Índia onde o público e respetivo júri eram crianças.
Na sequência das diversas apresentações públicas que já realizaram, depararam-se com o facto de existir um retorno de vários espetadores que, após terem assistido ao espetáculo, afirmaram que iriam ter em atenção algumas alterações comportamentais no seu quotidiano. Apesar desse carácter didático / pedagógico há a realçar a sobreposição de uma camada poética sobre a “prosa” desta narrativa que nos foi apresentada. Com esta estratégia dramatúrgica, facilmente “voamos” da plateia e somos transportados para o palco, mergulhando assim no rico universo construído pelos Valdevinos. Um universo de esperança que existe no olhar de quem tem pouco.
Foi ainda referida pelos espetadores presentes nas duas sessões do espetáculo no Auditório António Silva, no Cacém, a simbiose que se dá entre o marionetista e a sua marioneta, especialmente no caso da manipulação direta de APARA, em que, segundo os marionetistas, a marioneta é, de certa forma, uma extensão de quem manipula, e todos os movimentos são como uma coreografia, “uma dança a dois”. Geralmente, é o marionetista a conduzir essa dança. Contudo, noutras ocasiões, é a própria marioneta a dirigir o marionetista, neste constante diálogo bailado.
dia #2.4.4 | 23.10.2016
O dia chegou ao fim com um excelente concerto da cantautora britânica Lewis Barfoot, acompanhada pela violoncelista espanhola Maria Reyna. O espaço do MU.SA - Museu das Artes de Sintra acolheu várias atividades promovidas pelo teatromosca ao longo de todo o dia. Foi o caso deste concerto que marca o encerramento da edição de 2016 do festival de artes performativas de Agualva-Cacém-Sintra.
O festival terá ainda uma extensão no próximo fim-de-semana, 29 e 30 de outubro, no Auditório António Silva, no Cacém, com a apresentação de um espetáculo dos Valdevinos - Teatro de Marionetas. |
dia #2.4.3 | 23.10.2016
A Mesa Redonda sobre Teatro, Cenografia e Design de Cena, um dos momentos de formação do MUSCARIUM#2, teve lugar numa das instalações da exposição “O objecto cenográfico como elemento dramatúrgico” – esta sobre os três espetáculos do projeto Trilogia Norte Americana, do teatromosca. Na longa mesa que reenquadrava a cenografia do espetáculo Moby-Dick, no terceiro andar do MU.SA – Museu das Artes de Sintra, sob uma grande clarabóia, demos a boas vindas aos três convidados: Inês de Carvalho, José Capela e Sara Franqueira.
Neste contexto a conversa fluiu entre as temáticas da prática de cenografia versus a prática de arquitetura, suas ligações e ruturas. A problemática fundadora da investigação que esteve na origem da exposição – “como expor cenografia?” - foi igualmente abordada. Os três convidados, acompanhados do cenógrafo do teatromosca, Pedro Silva, retiraram exemplos da sua prática profissional, expondo episódios de projetos nos quais estiveram envolvidos.
Um dos argumentos mais curiosos da conversa, que acabaria por revelar-se uma ótima base de discussão, centrou-se na questão do contexto e/ou evento no qual o dispositivo cenográfico é apresentado. Este revela-se, assim, crucial para a forma como a cenografia – em cena, exposta etc. – é entendida e como esta transmite significados. O contexto e/ou o evento predefinem, de igual forma, o olhar do espetador sobre os objetos que está a ver, afetando a sua inteligibilidade.
À volta da mesa contámos com a presença de alguns espetadores que tinham vindo a acompanhar o festival, profissionais das artes do espetáculos e curiosos, que tiveram a oportunidade de colocar as suas questões aos convidados e à equipa do teatromosca. Já perto da hora prevista do final da conversa, um jantar começou a ser servido, deixando a conversa seguir num ambiente ainda mais descontraído.
Neste contexto a conversa fluiu entre as temáticas da prática de cenografia versus a prática de arquitetura, suas ligações e ruturas. A problemática fundadora da investigação que esteve na origem da exposição – “como expor cenografia?” - foi igualmente abordada. Os três convidados, acompanhados do cenógrafo do teatromosca, Pedro Silva, retiraram exemplos da sua prática profissional, expondo episódios de projetos nos quais estiveram envolvidos.
Um dos argumentos mais curiosos da conversa, que acabaria por revelar-se uma ótima base de discussão, centrou-se na questão do contexto e/ou evento no qual o dispositivo cenográfico é apresentado. Este revela-se, assim, crucial para a forma como a cenografia – em cena, exposta etc. – é entendida e como esta transmite significados. O contexto e/ou o evento predefinem, de igual forma, o olhar do espetador sobre os objetos que está a ver, afetando a sua inteligibilidade.
À volta da mesa contámos com a presença de alguns espetadores que tinham vindo a acompanhar o festival, profissionais das artes do espetáculos e curiosos, que tiveram a oportunidade de colocar as suas questões aos convidados e à equipa do teatromosca. Já perto da hora prevista do final da conversa, um jantar começou a ser servido, deixando a conversa seguir num ambiente ainda mais descontraído.
dia #2.4.2 | 23.10.2016
No âmbito do MUSCARIUM#2, o teatromosca apresentou uma performance site-specific FAHRENHEIT 451 - Combustão Forte, a partir da adaptação do romance de Ray Bradbury, servindo-se de um dispositivo semelhante a um audiowalk, enquadado na exposição de cenografia e design de cena dedicada ao trabalho de Pedro Silva na Trilogia Norte-Americana produzida pelo teatromosca, que esteve patente no MU.SA - Museu das Artes de Sintra.
dia #2.4.1 | 23.10.2016
O dia 23 de outubro revelou-se um dos mais preenchidos e concorridos dias desta segunda edição do MUSCARIUM. A jornada começou logo às 11h, na Sala de Ensaios do Centro Cultural Olga Cadaval, em Sintra, com a realização do workshop de Teatro Físico, ministrado pela atriz Lowri Jenkins da companhia britânica NOVA, que apresentou o espetáculo Invisible City (Cidade Invisível) no dia anterior no Auditório António Silva, no Cacém. As vagas para o workshop foram totalmente preenchidas e foram muitos os que já não conseguiram inscrever-se. Fica já agendado um reencontro com esta criadora do País de Gales, que, em 2017, voltará a Sintra para uma formação mais longa. Fiquem atentos!
dia #2.4 | 23.10.2016
Por agora dizemos adeus ao Auditório António Silva e ao Cacém e seguimos viagem para o MU.SA - Museu das Artes de Sintra. Ontem à noite, desmontámos projetores, cenários, escritório... Seguimos para o centro de Sintra. É lá que estaremos o dia todo.
Daqui a pouco, iniciará o workshop de teatro físico ministrado por Lowri Jenkins, no Centro Cultural Olga Cadaval. Depois de almoço, será a vez de vivermos a performance site-specific FAHRENHEIT 451 - Combustão Forte, a partir da adaptação do romance de Ray Bradbury, em relação direta com a exposição de cenografia e design de cena dedicada ao trabalho de Pedro Silva na Trilogia Norte-Americana produzida pelo teatromosca.
Às 18h, estaremos sentados à mesa do MOBY-DICK, como tripulantes do Pequod, para conversar sobre cenografia. A conversa abrirá o apetite. Jantaremos todos juntos, nessa mesma mesa, às 20h. E esta grande jornada chegará ao fim com um concerto de Lewis Barfoot e Maria Reyna, às 22h, no MU.SA.
Imperdível!
Daqui a pouco, iniciará o workshop de teatro físico ministrado por Lowri Jenkins, no Centro Cultural Olga Cadaval. Depois de almoço, será a vez de vivermos a performance site-specific FAHRENHEIT 451 - Combustão Forte, a partir da adaptação do romance de Ray Bradbury, em relação direta com a exposição de cenografia e design de cena dedicada ao trabalho de Pedro Silva na Trilogia Norte-Americana produzida pelo teatromosca.
Às 18h, estaremos sentados à mesa do MOBY-DICK, como tripulantes do Pequod, para conversar sobre cenografia. A conversa abrirá o apetite. Jantaremos todos juntos, nessa mesma mesa, às 20h. E esta grande jornada chegará ao fim com um concerto de Lewis Barfoot e Maria Reyna, às 22h, no MU.SA.
Imperdível!
DIA #2.3.2 | 22.10.2016
Invisible City (Cidade Invisível), da companhia britânica NOVA, apresenta em palco um conto da vida moderna, esta citadina, impessoal e obcecada pelo sucesso profissional. Marie, uma jovem enérgica e aventureira, dá por si numa grande cidade sem relações próximas com outras pessoas. Perante o falhanço de diversas tentativas de interação, Marie, assombrada pelo peso das expetativas do seu sucesso, acaba por ocultar a verdade e embelezar os factos do seu dia-a-dia.
O espetáculo, dirigido por Jennifer Fletcher, prima pela simplicidade dos conceitos e das imagens construídas em palco. A atriz Lowri Jenkins demonstra uma fisicalidade e presença únicas em palco: inteligente, sensível e perspicaz. O turbilhão de palavras, movimentos e estados emocionais consegue, ao mesmo tempo, ser frenético e amável.
Na conversa após o espetáculo, ficou clara a motivação original da criação do espetáculo. Viver numa cidade grande, rodeada de tanta gente, significa, muitas vezes, uma alienação do indivíduo. O projeto explora, precisamente, esse sentimento de solidão num ambiente que parecia mais propício à criação de relações entre os indíviduos. Quando as relação interpessoais, físicas no tempo e no espaço, não acontecem, o ser humano começa a viver dentro da sua cabeça encenando conversas e situações consigo mesmo.
Com Marie persiste um sentimento de saudade do lar e do sentido de pertença a um lugar. Pois a cidade apesar dos seus monumentos, grandes avenidas, jardins e espaços público torna-se invisível para o agente que a habita, e que a deveria viver.
O espetáculo, dirigido por Jennifer Fletcher, prima pela simplicidade dos conceitos e das imagens construídas em palco. A atriz Lowri Jenkins demonstra uma fisicalidade e presença únicas em palco: inteligente, sensível e perspicaz. O turbilhão de palavras, movimentos e estados emocionais consegue, ao mesmo tempo, ser frenético e amável.
Na conversa após o espetáculo, ficou clara a motivação original da criação do espetáculo. Viver numa cidade grande, rodeada de tanta gente, significa, muitas vezes, uma alienação do indivíduo. O projeto explora, precisamente, esse sentimento de solidão num ambiente que parecia mais propício à criação de relações entre os indíviduos. Quando as relação interpessoais, físicas no tempo e no espaço, não acontecem, o ser humano começa a viver dentro da sua cabeça encenando conversas e situações consigo mesmo.
Com Marie persiste um sentimento de saudade do lar e do sentido de pertença a um lugar. Pois a cidade apesar dos seus monumentos, grandes avenidas, jardins e espaços público torna-se invisível para o agente que a habita, e que a deveria viver.
DIA #2.3.1 | 22.10.2016
Os mais pequenos - os muito pequenos - também encontram o seu espaço no MUSCARIUM#2. Inês de Carvalho e Sara Figueiredo dinamizaram o espetáculo-oficina para bebés, NUVEM. Adultos e crianças foram levados pelo vento, o pastor de nuvens, na direção da Casa da Cultura Lívio de Morais, em Mira Sintra.
Trata-se de um projeto de exploração sensorial, com forte componente teatral e musical, de descoberta de materiais visuais e sonoros e de criação de "acontecimentos-histórias" (como lhes chamaram as criadoras) que dependem, em grande medida, das decisões que cada bebé toma. Na verdade são eles que guiam os pais que, em alguns momentos, hesitam em seguir os protagonistas neste espaço-nuvem. O ambiente criado é de grande intimismo e tranquilidade.
Trata-se de um projeto de exploração sensorial, com forte componente teatral e musical, de descoberta de materiais visuais e sonoros e de criação de "acontecimentos-histórias" (como lhes chamaram as criadoras) que dependem, em grande medida, das decisões que cada bebé toma. Na verdade são eles que guiam os pais que, em alguns momentos, hesitam em seguir os protagonistas neste espaço-nuvem. O ambiente criado é de grande intimismo e tranquilidade.
DIA #2.2 | 21.10.2016
O espetáculo Who do you want to be today?, criação de Margarida Belo Costa e Elson Ferreira, trata da ideia da aparência do ser casal – como é que um casal disfarça, por via dos acessórios ou das atitudes, o que está mal na sua relação.
Interpretado por Rita Carpinteiro e Luís Malaquias, o espetáculo apresenta uma hábil montagem de quadros, estes de inspiração literária e visual. Para o processo criativo foram convocados vários casais impressos nos livros de História, e no reportório do cinema de Hollywood, como Maria Antonieta e Luís XVI, Adão e Eva ou Romeu e Julieta. O espetáculo apresenta dois momentos bem demarcados – o primeiro dominado, essencialmente, pela mímica de ações e traços icónicos do comportamento dos homens e mulheres em questão. O segundo, por sua vez, surge no exercício da exploração do movimento abstrato e em duo executado pelos bailarinos.
A força dos momentos em duo mostraram com bastante clareza e definição o conceito fundador do espetáculo. É na relação entre os corpos, as vontades e os desejos, que a individualidade de cada um, homem e mulher, ganha mais significado. O desejo, a paixão, a morte são aqui explorados na atração e repulsa dos corpos e através da dramaturgia do movimento e do ritmo da construção.
No decorrer da conversa com o público, e perante uma plateia constituída, essencialmente, por jovens bailarinos, foram levantadas questões sobre a precariedade da vida dos bailarinos em Portugal, traduzida, por exemplo, nos dez ensaios que o grupo teve antes da estreia do espetáculo no MUSCARIUM #2. A estreia deste espetáculo assinala o primeiro acolhimento de um espetáculo de dança no festival MUSCARIUM. E, como alguém disse em algum momento desta noite: “Fica bem a dança no palco do António Silva”.
Interpretado por Rita Carpinteiro e Luís Malaquias, o espetáculo apresenta uma hábil montagem de quadros, estes de inspiração literária e visual. Para o processo criativo foram convocados vários casais impressos nos livros de História, e no reportório do cinema de Hollywood, como Maria Antonieta e Luís XVI, Adão e Eva ou Romeu e Julieta. O espetáculo apresenta dois momentos bem demarcados – o primeiro dominado, essencialmente, pela mímica de ações e traços icónicos do comportamento dos homens e mulheres em questão. O segundo, por sua vez, surge no exercício da exploração do movimento abstrato e em duo executado pelos bailarinos.
A força dos momentos em duo mostraram com bastante clareza e definição o conceito fundador do espetáculo. É na relação entre os corpos, as vontades e os desejos, que a individualidade de cada um, homem e mulher, ganha mais significado. O desejo, a paixão, a morte são aqui explorados na atração e repulsa dos corpos e através da dramaturgia do movimento e do ritmo da construção.
No decorrer da conversa com o público, e perante uma plateia constituída, essencialmente, por jovens bailarinos, foram levantadas questões sobre a precariedade da vida dos bailarinos em Portugal, traduzida, por exemplo, nos dez ensaios que o grupo teve antes da estreia do espetáculo no MUSCARIUM #2. A estreia deste espetáculo assinala o primeiro acolhimento de um espetáculo de dança no festival MUSCARIUM. E, como alguém disse em algum momento desta noite: “Fica bem a dança no palco do António Silva”.
DIA #2.1 | 20.10.2016
O teatromosca acolheu ontem o espetáculo I Can't Breathe de Elmano Sancho, com a ex-atriz de cinema pornográfico, Ana Monte Real. Motivado pelos acontecimentos em torno da morte do norte-americano Eric Garner que deram origem ao movimento I Can’t Breathe, Elmano Sancho e Ana Monte Real juntaram-se a Rui Catalão para criarem um espetáculo que funciona com um dispositivo próximo do "espetáculo" que é o tribunal (com claras influências dos procedimentos de um julgamento nos EUA) ou que se assemelha mais a um combate violento, em que os dois atores vão arremessando questões como duros golpes.
Elmano inspirou-se neste polémico caso verídico de Eric Garner para partir para uma reflexão sobre a pornografia e sobre a mediatização da vida quotidiana, onde a intimidade de cada um é violada sistematicamente, em muitos casos de forma consentida e encenada. O jovem ator e encenador português afirmou que procurou dirigir este processo criativo "sem filtros", explorando, de forma dura, as memórias e as inquietações que os assaltam (as recordações de infância, as primeiras relações amorosas, as primeiras experiências sexuais, o receio da morte...). Em conversa após o espetáculo, Ana Monte Real revelou-nos que lhe interessou a possibilidade de ver de perto as expressões faciais dos espetadores que, inevitavelmente, começam por olhá-la, no mínimo, com desconfiança no início do espetáculo e que, com o evoluir da performance, vão mudando ao descobrirem as histórias (e as marcas, as cicatrizes) de uma mulher que ama o seu pai, que também foi criança e que construiu grande parte da sua carreira profissional num género cinematográfico que é, ainda hoje, olhado com desdém. Os espetadores de um filme pornográfico projetam nos atores uma intimidade que, segundo a atriz, se encontra ausente, que é ficcionada. É sobre esse olhar de abutre, voyeur, do cidadão de hoje, que o coletivo procurou centrar a sua reflexão.
Elmano inspirou-se neste polémico caso verídico de Eric Garner para partir para uma reflexão sobre a pornografia e sobre a mediatização da vida quotidiana, onde a intimidade de cada um é violada sistematicamente, em muitos casos de forma consentida e encenada. O jovem ator e encenador português afirmou que procurou dirigir este processo criativo "sem filtros", explorando, de forma dura, as memórias e as inquietações que os assaltam (as recordações de infância, as primeiras relações amorosas, as primeiras experiências sexuais, o receio da morte...). Em conversa após o espetáculo, Ana Monte Real revelou-nos que lhe interessou a possibilidade de ver de perto as expressões faciais dos espetadores que, inevitavelmente, começam por olhá-la, no mínimo, com desconfiança no início do espetáculo e que, com o evoluir da performance, vão mudando ao descobrirem as histórias (e as marcas, as cicatrizes) de uma mulher que ama o seu pai, que também foi criança e que construiu grande parte da sua carreira profissional num género cinematográfico que é, ainda hoje, olhado com desdém. Os espetadores de um filme pornográfico projetam nos atores uma intimidade que, segundo a atriz, se encontra ausente, que é ficcionada. É sobre esse olhar de abutre, voyeur, do cidadão de hoje, que o coletivo procurou centrar a sua reflexão.
SEMANA#1
MUSCARIUM#2 | semana#1 from teatromosca on Vimeo.
DIA#1.4 | 16.10.2016
A Casa da Marioneta, em Agualva, acolheu o último espetáculo da primeira semana do MUSCARIUM#2 - festival de artes performativas em Agualva-Cacém-Sintra. Da autoria e com manipulação do encenador espanhol Adolfo Simón, BOOKS, produzido pela Plataforma Nido Dadá, é uma emocionante viagem em direção ao imaginário infantil, sem que se possa dizer que se trate de um espetáculo para crianças. Através da manipulação de pequenos objetos e de velhos livros reutilizados, sem o auxílio de palavras e recorrendo a uma única faixa sonora quase impercetível, o público é levado através de uma teia narrativa sempre surpreendente. Uma pequena boneca de porcelana serve-nos de guia.
O autor e encenador espanhol falou-nos da felicidade de regressar a Sintra - onde tinha dirigido o espetáculo Obscuro Amor, em 1998, na Companhia de Teatro de Sintra, a partir de uma colagem de textos do poeta e dramaturgo espanhol Federico García Lorca -, do seu percurso artístico tão rico com mais de 30 anos de atividade e da necessidade de se reinventar depois de, à semelhança de tantos outros, ter sido confrontado com a crise económica que tem vindo a afetar cada vez mais o financiamento das artes. Adolfo falou-nos ainda da criação da Plataforma Nido Dadá e do Centro Dramático Rural em Mira (Cuenca), uma casa familiar que recuperou depois do falecimento dos seus pais. Depois de um ano de reflexão e de exílio da vida agitada da capital espanhola, o autor e encenador regressou de Cuenca com uma proposta artística extremamente arriscada, que, de forma poética e, através do silêncio, mergulha a plateia num imaginário que remete tanto o encanto da infância, como para os anseios e as dores da vida adulta.
Rimando com os espetáculos apresentados no dia anterior, Adolfo Simón revelou-nos um objeto artístico (muitos, aliás!) que deve ser presenciado - o conceito de "presença", tal como é visto por Ernst Gumbrecht parece-nos essencial para uma atenta observação desta obra -, que valoriza a memória e que reanima livros e pequenos objetos do quotidiano que mais depressa terminariam no lixo. Foi com este momento memorável e a emocionante conversa que o seguiu que chegou ao fim a primeira semana do MUSCARIUM#2.
Esta semana, o festival receberá espetáculos de teatro da autoria de Elmano Sancho (20.10.2016) e da companhia britânica NOVA (22.10.2016), a estreia mundial da coreografia de Margarida Belo Costa e Elson Ferreira (21.10.2016), uma performance site-specific pelo teatromosca e um concerto da cantautora britânica Lews Barfoot (23.10.2016).
O autor e encenador espanhol falou-nos da felicidade de regressar a Sintra - onde tinha dirigido o espetáculo Obscuro Amor, em 1998, na Companhia de Teatro de Sintra, a partir de uma colagem de textos do poeta e dramaturgo espanhol Federico García Lorca -, do seu percurso artístico tão rico com mais de 30 anos de atividade e da necessidade de se reinventar depois de, à semelhança de tantos outros, ter sido confrontado com a crise económica que tem vindo a afetar cada vez mais o financiamento das artes. Adolfo falou-nos ainda da criação da Plataforma Nido Dadá e do Centro Dramático Rural em Mira (Cuenca), uma casa familiar que recuperou depois do falecimento dos seus pais. Depois de um ano de reflexão e de exílio da vida agitada da capital espanhola, o autor e encenador regressou de Cuenca com uma proposta artística extremamente arriscada, que, de forma poética e, através do silêncio, mergulha a plateia num imaginário que remete tanto o encanto da infância, como para os anseios e as dores da vida adulta.
Rimando com os espetáculos apresentados no dia anterior, Adolfo Simón revelou-nos um objeto artístico (muitos, aliás!) que deve ser presenciado - o conceito de "presença", tal como é visto por Ernst Gumbrecht parece-nos essencial para uma atenta observação desta obra -, que valoriza a memória e que reanima livros e pequenos objetos do quotidiano que mais depressa terminariam no lixo. Foi com este momento memorável e a emocionante conversa que o seguiu que chegou ao fim a primeira semana do MUSCARIUM#2.
Esta semana, o festival receberá espetáculos de teatro da autoria de Elmano Sancho (20.10.2016) e da companhia britânica NOVA (22.10.2016), a estreia mundial da coreografia de Margarida Belo Costa e Elson Ferreira (21.10.2016), uma performance site-specific pelo teatromosca e um concerto da cantautora britânica Lews Barfoot (23.10.2016).
dia#1.3.2 | 15.10.2016
A Terceira Pessoa e Óscar Silva (que, de forma irónica, se apresentou como um “homem livre”) criaram o espetáculo The Old Image of Being Loved no 3º dia do MUSCARIUM#2, oferecendo-nos (a possibilidade de) um olhar crítico sobre algumas das questões que podem ser levantadas a propósito das relações que se estabelecem entre atores e espetadores num evento teatral.
Reconhecendo os riscos que uma proposta artística como esta apresenta, o coletivo albicastrense e Óscar Silva, pretenderam discutir o papel central desempenhado pelo público na definição e na concretização de um acontecimento teatral. Sabemos pois que, em certo sentido, a presença do espetador é tão importante quanto a própria performance. Na conversa que se seguiu ao espetáculo – ou, tal como um dos espetadores-atores preferiu entender, no “verdadeiro terceiro ato” da performance -, foram discutidas as relações que se estabelecem efetivamente entre a cena e a plateia e que elementos tendem a perturbar ou influenciar essas relações e, tendo em conta o projeto apresentado, de que forma a presença do público (e a sua real ativação) pode afetar o acontecimento teatral.
Foi tão longa a conversa como o espetáculo, e, contudo, poderíamos ainda ter discutido a forma como se processa essa relação entre espetadores e atores e qual o real sentido (ou a falta dele) da ativação do espetador num evento teatral? E o que se produz nessa/com essa inversão de papéis, proposta pelos criadores do espetáculo, simbolicamente representada pela troca de roupas executada entre um dos criadores (o autor!) e uma espetadora (que tomará o lugar e as palavras do autor)?
Poderíamos ainda ter discutido a importância que é dada/não é dada à relação com os públicos nos processos criativos e, de forma mais abrangente, em todo o sistema de produção teatral. Ou, como se poderá tentar estabelecer uma descrição da experiência sensível que se estabelece em cada espetáculo? O que pensam mesmo os espetadores do teatro? Certo é que o tempo nos dirá o que este espetáculo e o que este festival criaram de memorável. Podemos falar sobre tudo isto já hoje, às 16h, na Casa da Marioneta, antes da apresentação do espetáculo “BOOKS”, de Adolfo Simón, que encerrará a primeira das três semanas do festival. Venham!
Reconhecendo os riscos que uma proposta artística como esta apresenta, o coletivo albicastrense e Óscar Silva, pretenderam discutir o papel central desempenhado pelo público na definição e na concretização de um acontecimento teatral. Sabemos pois que, em certo sentido, a presença do espetador é tão importante quanto a própria performance. Na conversa que se seguiu ao espetáculo – ou, tal como um dos espetadores-atores preferiu entender, no “verdadeiro terceiro ato” da performance -, foram discutidas as relações que se estabelecem efetivamente entre a cena e a plateia e que elementos tendem a perturbar ou influenciar essas relações e, tendo em conta o projeto apresentado, de que forma a presença do público (e a sua real ativação) pode afetar o acontecimento teatral.
Foi tão longa a conversa como o espetáculo, e, contudo, poderíamos ainda ter discutido a forma como se processa essa relação entre espetadores e atores e qual o real sentido (ou a falta dele) da ativação do espetador num evento teatral? E o que se produz nessa/com essa inversão de papéis, proposta pelos criadores do espetáculo, simbolicamente representada pela troca de roupas executada entre um dos criadores (o autor!) e uma espetadora (que tomará o lugar e as palavras do autor)?
Poderíamos ainda ter discutido a importância que é dada/não é dada à relação com os públicos nos processos criativos e, de forma mais abrangente, em todo o sistema de produção teatral. Ou, como se poderá tentar estabelecer uma descrição da experiência sensível que se estabelece em cada espetáculo? O que pensam mesmo os espetadores do teatro? Certo é que o tempo nos dirá o que este espetáculo e o que este festival criaram de memorável. Podemos falar sobre tudo isto já hoje, às 16h, na Casa da Marioneta, antes da apresentação do espetáculo “BOOKS”, de Adolfo Simón, que encerrará a primeira das três semanas do festival. Venham!
ONTEM... dia#1.3.1 | 15.10.2016
NOVO_título provisório criação de Yola Pinto e João de Brito, apresentado na Casa da Cultura Lívio de Morais, ganhou o seu título a partir de vários documentos com o mesmo nome, guardados no computador dos criadores e relativos ao novo espetáculo que estavam a criar juntos. Para além de se tratar de uma nova criação, o tema recorrente no início do processo criativo prendia-se com o experimentar de novas ações e sensações.
João de Brito, o ator/bailarino, esforça-se por não fazer nada, à espera que uma nova ideia ou estímulo lhe atravesse a mente e o corpo. O performer deixa-se ir atrás da nova possibilidade, evidenciando uma presença e plasticidade do corpo em contracena direta com o público, sem mediação de personagem. Vários exemplos apresentados são retirados da vida do ator: da primeira vez que enganou o adversário num jogo de basquetebol, ao momento em que abre uma caixa e descobre uma prenda no seu interior. Contudo a experiência de novo passa, assim como passa o tempo, e a repetição obriga à reciclagem da acção ou sensação. Assim se percebe que o novo é provisório – está sempre a mudar, está sempre a fugir. O passar do novo gera um novo (novo) e perpetua a memória – a memória da sensação da novidade e da descoberta em nós.
João de Brito, o ator/bailarino, esforça-se por não fazer nada, à espera que uma nova ideia ou estímulo lhe atravesse a mente e o corpo. O performer deixa-se ir atrás da nova possibilidade, evidenciando uma presença e plasticidade do corpo em contracena direta com o público, sem mediação de personagem. Vários exemplos apresentados são retirados da vida do ator: da primeira vez que enganou o adversário num jogo de basquetebol, ao momento em que abre uma caixa e descobre uma prenda no seu interior. Contudo a experiência de novo passa, assim como passa o tempo, e a repetição obriga à reciclagem da acção ou sensação. Assim se percebe que o novo é provisório – está sempre a mudar, está sempre a fugir. O passar do novo gera um novo (novo) e perpetua a memória – a memória da sensação da novidade e da descoberta em nós.
DIA#1.2 | 14.10.2016
André Amálio iniciou a conversa com o público apresentando os elementos que compõem o espetáculo PASSA-PORTE, a equipa da companhia HOTEL EUROPA e o respetivo percurso artístico iniciado há cerca de cinco anos em Londres.
Segundo André Amálio, o espetáculo a que assistimos faz parte de um processo ainda em construção, tendo sido apresentada somente a primeira parte, e estreará no próximo dia 4 de novembro no Teatro Municipal Maria Matos, em Lisboa. PASSA-PORTE é o segundo espetáculo de uma trilogia iniciada em 2015 com PORTUGAL NÃO É UM PAÍS PEQUENO, sobre o processo de descolonização portuguesa nos países africanos na segunda metade do século XX, incidindo sobre as causas e os efeitos nas diversas sociedades intervenientes nesse processo. PASSA-PORTE faz parte de uma tese de doutoramento que André Amálio se encontra a realizar numa Universidade em Londres, sobre a representação destas temáticas nas artes performativas.
Este interesse na procura de novas formas na representação da recente História de Portugal que nos foi contada - iniciando-se nos Descobrimentos Portugueses no século XV, resultando daí uma glorificação da raça portuguesa, os seus feitos científicos que permitiram “descobrir o Mundo” e culminando na imposição de um ideal durante o período da ditadura do Estado Novo - tem sido comum a um cada vez maior número de académicos e artistas portugueses nas mais variadas manifestações artísticas, com o objetivo de desmistificar essa mesma História.
E como? Escavando e/ou abrindo gavetas, descobrindo outra(s) história(s) que a “História” não nos contou. Para compreendermos o presente que vivemos é preciso interrogarmo-nos sobre o passado, sobre o que nos precedeu, procurando onde “outros” não tiveram coragem de o fazer e, simultaneamente, olhar a História para além dos apertados limites da memória glorificadora dos governantes e dos seus atos políticos, contrariando a ideia de Thomas Carlyle de que a História não é mais do que o conjunto das biografias de grandes homens, aceitando a conceção de que são os homens e mulheres que “fazem”/ “são” a História.
A forma de a representar tem sido uma preocupação constante e fundamental nos processos criativos de André Amálio e o recurso ao teatro documental apresenta-se como uma forma de trabalhar a partir de relatos pessoais – neste caso, entrevistas - e acontecimentos não glorificados pela história oficial, agregando-se, à memória social, vozes muitas vezes dissonantes em relação à ordem vigente. Na sua representação serve-se de vários tipos de linguagens artísticas, desde a dança, à palavra dita, passando pela música e pelo vídeo, concorrendo para criar um multidisciplinar, onde podemos escutar diferentes vozes, que nos apresentam testemunhos, em alguns momentos, contraditórios, representando realidades que, todas juntas, formam um caleidoscópio de pontos de vista de cada um dos lados da “barreira”.
E a forma como André Amálio utiliza o teatro verbatim, em que, com o recurso a auscultadores, os performers dão voz aos testemunhos autênticos de pessoas de várias idades e origens, permite-nos refletir sobre as fragilidades que existem na construção que fazemos de uma imagem do país em que vivemos, em que não questionamos os processos políticos conduzidos pelas elites de uma sociedade que se vai deparando com aculturações, acumulações de múltiplas origens e que vai resultando em conflitos sociais/culturais causados pelo desconhecimento e pela ignorância do Outro.
Segundo André Amálio, o espetáculo a que assistimos faz parte de um processo ainda em construção, tendo sido apresentada somente a primeira parte, e estreará no próximo dia 4 de novembro no Teatro Municipal Maria Matos, em Lisboa. PASSA-PORTE é o segundo espetáculo de uma trilogia iniciada em 2015 com PORTUGAL NÃO É UM PAÍS PEQUENO, sobre o processo de descolonização portuguesa nos países africanos na segunda metade do século XX, incidindo sobre as causas e os efeitos nas diversas sociedades intervenientes nesse processo. PASSA-PORTE faz parte de uma tese de doutoramento que André Amálio se encontra a realizar numa Universidade em Londres, sobre a representação destas temáticas nas artes performativas.
Este interesse na procura de novas formas na representação da recente História de Portugal que nos foi contada - iniciando-se nos Descobrimentos Portugueses no século XV, resultando daí uma glorificação da raça portuguesa, os seus feitos científicos que permitiram “descobrir o Mundo” e culminando na imposição de um ideal durante o período da ditadura do Estado Novo - tem sido comum a um cada vez maior número de académicos e artistas portugueses nas mais variadas manifestações artísticas, com o objetivo de desmistificar essa mesma História.
E como? Escavando e/ou abrindo gavetas, descobrindo outra(s) história(s) que a “História” não nos contou. Para compreendermos o presente que vivemos é preciso interrogarmo-nos sobre o passado, sobre o que nos precedeu, procurando onde “outros” não tiveram coragem de o fazer e, simultaneamente, olhar a História para além dos apertados limites da memória glorificadora dos governantes e dos seus atos políticos, contrariando a ideia de Thomas Carlyle de que a História não é mais do que o conjunto das biografias de grandes homens, aceitando a conceção de que são os homens e mulheres que “fazem”/ “são” a História.
A forma de a representar tem sido uma preocupação constante e fundamental nos processos criativos de André Amálio e o recurso ao teatro documental apresenta-se como uma forma de trabalhar a partir de relatos pessoais – neste caso, entrevistas - e acontecimentos não glorificados pela história oficial, agregando-se, à memória social, vozes muitas vezes dissonantes em relação à ordem vigente. Na sua representação serve-se de vários tipos de linguagens artísticas, desde a dança, à palavra dita, passando pela música e pelo vídeo, concorrendo para criar um multidisciplinar, onde podemos escutar diferentes vozes, que nos apresentam testemunhos, em alguns momentos, contraditórios, representando realidades que, todas juntas, formam um caleidoscópio de pontos de vista de cada um dos lados da “barreira”.
E a forma como André Amálio utiliza o teatro verbatim, em que, com o recurso a auscultadores, os performers dão voz aos testemunhos autênticos de pessoas de várias idades e origens, permite-nos refletir sobre as fragilidades que existem na construção que fazemos de uma imagem do país em que vivemos, em que não questionamos os processos políticos conduzidos pelas elites de uma sociedade que se vai deparando com aculturações, acumulações de múltiplas origens e que vai resultando em conflitos sociais/culturais causados pelo desconhecimento e pela ignorância do Outro.
DIA#1.1 | 13.10.2016
O MUSCARIUM#2 abriu com uma noite de afetos, com a apresentação de diferentes propostas artísticas a cargo de três instituições sintrenses responsáveis por projetos de intervenção social – o projeto AgitArte do CECD de Mira Sintra; a Casa Seis; e a Universidade Senior Criar Afectos de Rio de Mouro. No final, na primeira de muitas conversas/encontros com os artistas que o teatromosca organizará no âmbito do festival, Pedro Alves moderou uma curta sessão de reflexão que contou com a presença em palco das técnicas do CECD de Mira Sintra responsáveis pelo AgitArte - Sofia, Mónica, Gorete e Cristina -, a Marisa do USCARM e o dinamizador cultural da Casa Seis, Dino.
A conversa andou solta, descontraída, voando entre o palco e a plateia, e começou por se centrar no trabalho desenvolvido pela Casa Seis ao nível da formação e orientação de jovens e crianças. Segundo o Dino, o que realmente interessa no projeto da Casa Seis são as pessoas, os jovens que encontram naquela instituição um lar que se preocupa em formar cidadãos de pleno direito, que possam ser verdadeiros protagonistas na criação duma sociedade mais justa e igualitária. Para o responsável desta Instituição Particular de Solidariedade Social, não são os projetos – o teatro, a dança, a música – que interessam. As disciplinas artísticas são uma ferramenta no processo de educação não formal dos jovens de Mira Sintra, com quem a Casa Seis trabalha.
As técnicas do CECD de Mira Sintra que participaram no debate – Gorete e Cristina – revelaram que o espetáculo apresentado está ainda em criação e que deverá estrear apenas no próximo ano. Manifestaram a sua preocupação com a qualidade de execução dos materiais – cenografia, figurinos, caraterização etc. – criados para os espetáculos produzidos pelo AgitArte e afirmaram o desejo de serem reconhecidos enquanto grupo de teatro que deve ser olhado para lá da sua ligação umbilical ao CECD de Mira Sintra. No seu trabalho, é fundamental a relação com as famílias dos membros do grupo e sobressai um cuidado na escolha do repertório do grupo, tendo em vista a conceção de propostas que misturem teatro e dança e que possam abranger o público familiar.
Depois de um primeiro encontro, na altura da criação do espetáculo “Europa” – produzido pelo teatromosca em 2011 -, a companhia voltou a cruzar-se com os elementos do projeto Criar Afectos, que, desde 2014, é agora a Universidade Sénior Criar Afectos de Rio de Mouro. Em linha com as palavras dos outros oradores, também a técnica responsável por este projeto quis deixar bem claro que o centro deste projeto é o indivíduo.
Saudou-se a iniciativa, por ter permitido a estas três instituições revelarem mais um pouco do seu trabalho e a por este encontro ter proporcionado uma genuína troca de saberes e experiências entre projetos – e pessoas! - que, geralmente, estão demasiado fechados sobre si mesmos. Fica o desejo de estabelecimento de parcerias e de criação de novos encontros e novos projetos em conjunto para um futuro que, em muitos sentidos, se quer próximo.
A conversa andou solta, descontraída, voando entre o palco e a plateia, e começou por se centrar no trabalho desenvolvido pela Casa Seis ao nível da formação e orientação de jovens e crianças. Segundo o Dino, o que realmente interessa no projeto da Casa Seis são as pessoas, os jovens que encontram naquela instituição um lar que se preocupa em formar cidadãos de pleno direito, que possam ser verdadeiros protagonistas na criação duma sociedade mais justa e igualitária. Para o responsável desta Instituição Particular de Solidariedade Social, não são os projetos – o teatro, a dança, a música – que interessam. As disciplinas artísticas são uma ferramenta no processo de educação não formal dos jovens de Mira Sintra, com quem a Casa Seis trabalha.
As técnicas do CECD de Mira Sintra que participaram no debate – Gorete e Cristina – revelaram que o espetáculo apresentado está ainda em criação e que deverá estrear apenas no próximo ano. Manifestaram a sua preocupação com a qualidade de execução dos materiais – cenografia, figurinos, caraterização etc. – criados para os espetáculos produzidos pelo AgitArte e afirmaram o desejo de serem reconhecidos enquanto grupo de teatro que deve ser olhado para lá da sua ligação umbilical ao CECD de Mira Sintra. No seu trabalho, é fundamental a relação com as famílias dos membros do grupo e sobressai um cuidado na escolha do repertório do grupo, tendo em vista a conceção de propostas que misturem teatro e dança e que possam abranger o público familiar.
Depois de um primeiro encontro, na altura da criação do espetáculo “Europa” – produzido pelo teatromosca em 2011 -, a companhia voltou a cruzar-se com os elementos do projeto Criar Afectos, que, desde 2014, é agora a Universidade Sénior Criar Afectos de Rio de Mouro. Em linha com as palavras dos outros oradores, também a técnica responsável por este projeto quis deixar bem claro que o centro deste projeto é o indivíduo.
Saudou-se a iniciativa, por ter permitido a estas três instituições revelarem mais um pouco do seu trabalho e a por este encontro ter proporcionado uma genuína troca de saberes e experiências entre projetos – e pessoas! - que, geralmente, estão demasiado fechados sobre si mesmos. Fica o desejo de estabelecimento de parcerias e de criação de novos encontros e novos projetos em conjunto para um futuro que, em muitos sentidos, se quer próximo.